segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Capítulo 4 - Heliópolis: Minha Ascensão e Minha Queda (Cont.)

Depois de contar sobre a conversa com a minha mãe, pela primeira vez em muito tempo, eu não conseguia decifrar a expressão de Bernardo, o que eu entendia perfeitamente, pois eu estava muito feliz pela minha mãe ter praticamente aceitado a minha homossexualidade, mas também não queria colocar tudo a perder se meu pai me flagrasse com Bernardo ou fosse informado do nosso relacionamento por algum servo. Assim, eu disse a Bernardo:

- Você se importa de ficar sozinho aqui? Creio que não posso dormir aqui com você...
- Bem...pra ser sincero, eu me importo com a sua ausência, mas compreendo os seus motivos! Então não se preocupe, eu vou estar amanhã na sua cerimônia como um simples companheiro de viagem...
- Ah...sobre isso...
- Não importa....se é o que você quer...tudo bem!
- Espera...você...você acha que eu quero voltar a ser um príncipe?
- Bem...sim...o seu pai disse que a cerimônia vai ser amanhã...meu pai e eu formos convidados e depois poderemos ir embora...

Bernardo falava as palavras cada vez mais compassadamente e eu notei um tom de mágoa em sua voz, então eu entendi o que ele estava pensando e me apressei em dizer:

- Bernardo, não é nada isso que você está pensando! Eu já te disse que não quero voltar a ser príncipe....mas...bem, o meu pai acha que é preciso desfazer o meu exilamento em frente a todo o povo do reino! Então eu meio que preciso voltar a ter o meu título para continuar aqui no reino com a minha mãe! Coisas de nobreza!
- Ah...então isso não foi ideia sua?
- Claro que não! Não seja bobo! Por que você pensou que fosse ideia minha?
- Bom...você demorou tanto pra vir falar comigo e, quando veio, praticamente não me deixou te tocar! Pensei que tivesse vindo me dizer que pensou melhor sobre a vida...a vida ao meu lado...quer dizer, olha só pra tudo o que você tem aqui! Por que abriria mão de tudo isso?
- Isso é simples de responder! Eu te amo! E, como diria minha sabia mãe, o importante é fazer as coisas por amor!

Inesperadamente, Bernardo me agarrou em seu braços, levantou-me e girou pelo quarto, depois me colocou na cama e me deu um beijo apaixonado. Depois de recuperar o fôlego, eu me apressei em pontuar:

- Desculpe-me por ter lhe deixado sozinho tanto tempo, mas a minha mãe tinha muito pra me falar e eu estava com tanta saudade...quanto ao que aconteceu quando eu cheguei...bem, eu não quero colocar tudo a perder com o meu pai, então eu quero lhe pedir um favor...aja como meu amigo enquanto estivermos aqui, pelo menos até que a minha mãe possa dissuadi-lo de suas más ideias quanto ao homossexualismo ou até que tenhamos partido...
- Você realmente deixaria a sua mãe aqui, se fosse preciso?
- Bem, eu realmente espero que não seja preciso! Mas sim, eu a deixaria, pois tenho certeza que ela entenderia e nós estamos harmonizados agora, então, mesmo que o pior aconteça a ela, meu coração está em paz...mas não vamos pensar assim, eu acredito que o amor do meu pai por ela seja a nossa maior esperança!
- Certo! Bem...então você precisa ir não é?
- Sim...eu preciso, afinal nós não queremos que nenhum servo relate a meu pai que eu passei a noite em seu quarto né?
- Você tem razão! Bom, então boa sorte na sua cerimônia amanhã!
- Espero que dê tudo certo!
- Vai dar, com certeza! Boa noite!
- Boa noite.

Houve um beijo de despedida e então eu fui para o meu quarto dormir. A caminho do meu quarto eu ouvi um ruido vindo de um dos inúmeros corredores do castelo, então eu fui averiguar e tive uma surpresa quando encontrei os dois oficiais que tinham vindo comigo de Luminus se beijando. Ao me verem os dois pareciam bastante desconfortáveis, então eu me adiantei e disse:

- O que está acontecendo?
- Príncipe Felipe, lamento que tenha presenciado isso, bem...
- Calma, é William o seu nome certo?
- Sim, isso mesmo senhor...
- Veja bem, eu queria lhes agradecer pessoalmente pelo que fizeram durante a nossa viagem, eu fiquei muito satisfeito com o modo como trataram a mim e aos meus convidados, então muito obrigado por isso! Bem...eu esperava que as circunstancias fossem bem menos embaraçosas, mas não acho que isso realmente seja importante. Quanto ao que estava acontecendo, não se preocupem, porque eu sou a última pessoa que reportaria isso ao meu pai.
- Agradecemos a sua gentileza senhor, mas tudo o que fizemos durante a viagem foi o nosso trabalho!
- Bem, na verdade, William não gosta de admitir, mas saber que alguém da nobreza é, digamos assim, "como nós", é reconfortante, o que pode ter influenciado o nosso modo de tratá-los, afinal o senhor parece ser uma boa pessoa, então gostar de um homem não deve ser tão ruim quanto o rei nos faz pensar, com todo respeito ao seu pai.
- Cuidado com o que diz Tomás!
- Não William, deixe que ele fale, pois eu acho que ele está certo! Tomás, eu aprendi a amar alguém durante o exílio e não é realmente ruim, mas o meu pai pensa muito diferente, o que pode tornar isso perigoso, então vocês não precisam se preocupar comigo, mas tenham mais cuidado, pois se meu pai chegar a tomar conhecimento disso, algo muito ruim pode acontecer a vocês!
- Nós nos descuidamos senhor, mas teremos mais cuidado!
- Muito bem, então eu vou me deitar e, cá entre nós, você formam um belo casal!
- Obrigado senhor!

Depois de ouvir a última frase em uníssono dos dois eu me despedi com um sorriso e me dirigi ao meu quarto. Quando me deitei eu não passei nem um minuto pensando no dia em que eu tive, então já estava dormindo.
No outro dia, eu não pude falar com Bernardo, pois logo ao amanhecer vários servos me ajudavam a me preparar para a cerimônia, desde o banho até a escolha das roupas. Quando se aproximava das dez horas eu já estava pronto, em vestes que eu não vestia havia muito tempo, mas que me faziam sentir muito bem. Os servos me guiaram até a sacada do castelo, onde estavam meu pai e minha mãe, que fazia o seu melhor para sorrir, apesar de eu perceber o quanto aquilo era difícil para ela em seu atual estado.
Quando eu cheguei à sacada pude ver a multidão que se espalhava no pátio de castelo e além dos portões e aquilo me fez ficar nervoso, mas mantive a postura formal que meus pais me ensinaram durante muito tempo e acenei para as pessoas. Então, meu pai elevou a voz e disse:

- Povo de Heliópolis! Estamos hoje aqui para celebrar o retorno do meu filho, o Príncipe Felipe II, que retorna do seu exílio e novamente se juntará à família real! A partir de hoje ele voltará a residir em nosso reino e a tratar dos assuntos reais. Para consagrar esse fato, eu chamo a Vossa Reverendíssima, o Sacerdote João Bosco, para abençoá-lo.

Um homem de aparência velha e dura adentrou a sacada, acenou para a multidão e então e virou para mim, então proferiu algumas palavras em tom quase inaudível, após as quais a multidão se agitou e eu fora oficialmente reiterado à Família Real de Heliópolis. Porém, eu não estava feliz com isso, afinal, segundo o que meu pai dissera, eu teria que voltar a Heliópolis, o que eu não almejava de modo algum, visto que eu adorava a minha vida em Luminus e, pelo que eu consegui visualizar da expressão de Bernardo durante o breve discurso do meu pai que se seguiu, ele também não estava contente com aquela notícia.
Ao final da cerimônia, enquanto o meu pai continuou conversando com o Sacerdote sobre alguns assuntos reais, eu segui até o aposento em que estava a minha mãe, a qual se regozijou ao receber a notícia de que a cerimônia havia transcorrido bem, exclamando:

- Que alegria te receber de volta em minha vida meu filho, principalmente nesse momento tão difícil! Obrigado por ter regressado!
- Bem...não é como se eu tivesse muita escolha com os oficiais que o papai mandou para me escoltar, mas, de qualquer forma, eu nunca deixaria de regressar para te ver!
- Realmente o seu pai tem um jeito, digamos assim, um pouco ameaçador, mas ele faz as coisas pensando no melhor para a nossa família!
- Eu sei mãe, eu o compreendo...eu acho...
- Que bom! Mas agora me diga uma coisa, onde estão as pessoas que te acolheram durante o seu exílio?
- Mãe...na empolgação de vir te ver eu esqueci completamente deles...mas, você quer vê-los?
- Claro meu filho! Quero agradecer pessoalmente a eles por cuidarem e me devolverem você!
- Isso é muito gentil da sua parte mãe! Bom, então eu vou chamá-los e volto em breve!

Eu não admiti para minha mãe que, de fato, eu não tinha esquecido de Bernardo e Manoel, apenas não conseguira encará-los depois da cerimônia, pois não sabia o que dizer em relação ao fato de que teria que permanecer em Heliópolis bem mais tempo do que eu esperava e não sabia se eles poderiam me aguardar, visto que tinham deixado a família em Luminus. Entretanto, eu criei coragem e sai do quarto de minha mãe, caminhando em direção aos quartos de Manoel e Bernardo.
O quarto de Manoel foi o primeiro, principalmente porque eu sabia que seria mais fácil lidar com ele e, realmente foi já que, quando eu entrei no quarto, ele logo exclamou:

- Felipe, meu filho, percebo que você está triste e acho que sei o motivo...Não se preocupe, eu e, imagino que Bernardo também, entendo a importância da sua permanência aqui nesse momento tão delicado da vida da sua mãe e, embora eu receie que nós não poderemos permanecer aqui com você, visto que eu deixei o meu pai e meus filhos em Luminus, eu quero que saiba que tens todo o meu apoio!
- Manoel...eu nem sei o que dizer...isso estava me matando por dentro de tanta angústia! Mas o senhor sempre sabe me acalmar! Muito obrigado pelo seu apoio e eu realmente lamento não poder retornar com vocês para Luminus, pois eu quero que o senhor saiba que eu me senti extremamente bem acolhido nesse tempo em que eu fiquei lá, além disso eu o considero o meu segundo pai, então eu prometo que voltarei para visitá-los em breve!
- Estaremos aguardando o seu retorno ansiosamente!
- Quando vocês pretendem partir?
- Eu acordei com Bernardo de partirmos em dois dias e ele, relutantemente, concordou! E, por falar nele, acho que vocês precisam conversar, certo?
 - Sim, de fato nós precisamos...eu vou ao quarto dele fazer isso, mas eu volto daqui a pouco, pois a minha mãe quer conhecê-los!
- Será uma honra conhecer a Rainha! Eu estarei aqui aguardando.

Depois de sair do quarto de Manoel, eu ainda permaneci alguns instantes parado em frente à porta do quarto de Bernardo, sem coragem de bater, até que, inesperadamente, a porta se abriu e uma mão me puxou para dentro do aposento. Em um único movimento, Bernardo me puxou em direção ao seu peito, me envolveu com um braço e fechou a porta com o outro, então disse:

- Eu te amo!
- Bernardo...eu...eu também te amo...
- Eu não queria ter que partir! Eu queria ficar aqui com você! Mas eu não posso deixar o meu pai, minhas irmãs, meu irmão e meu avô sozinhos! Eu te peço desculpas por ter que te deixar...
- Shh...Você não tem nada pelo que se desculpar Bernardo! Na verdade, sou eu quem deve pedir desculpas por te trazer aqui só pra me ver ficar enquanto você tem que partir sozinho! Mas, eu não posso deixar a minha mãe nesse momento tão difícil!
- Eu entendo isso! Eu compreendo e aprecio o que você tem que fazer par ficar com a sua mãe...mas isso me deixa tão triste!
- Isso também me entristece! Por isso eu não vim logo falar com você depois da cerimônia...eu estava tão triste que não sabia o que fazer ou como te contar que eu não poderia regressar com você para Luminus, então eu fugi para o quarto da minha mãe...Eu peço desculpas por te deixar sozinho novamente!
- Não há qualquer problema! Mas...e quanto a nós?...digo...nós ainda seremos namorados?
- É óbvio que ainda seremos namorados! Ninguém, em toda a minha vida, me fez tão feliz quanto você me faz! E não há ninguém aqui que possivelmente possa fazer! Então, sim, nós ainda seremos namorados...bem, se você quiser, é claro...
- O que você acha?

A minha resposta foi Bernardo me agarrar mais forte e me beijar tão apaixonadamente quanto na primeira vez em que declaramos amor um pelo outro. Depois disso, eu contei a Bernardo sobre o desejo da minha mãe de conhecer os meus bem-feitores e isso pareceu animá-lo bastante, embora eu tenha notado que isso também o deixou bastante nervoso, pois, segundo ele, era uma grande responsabilidade conhecer a mãe do namorado que também era Rainha do grande Reino de Heliópolis!
Em detrimento do nervosismo ele me acompanhou de bom grado, então nós paramos no quarto de Manoel para chamá-lo e depois seguimos em direção ao quarto da minha mãe. Aquele encontro entre a minha velha e a minha nova família tinha me deixado bastante feliz, pois parecia que, finalmente, juntar a minha antiga realidade com a minha nova e feliz vida ao lado de Bernardo e sua família poderia ser um objetivo alcançável e que traria bons frutos.

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